Tuning Legal
Sim, é possível mexer no carro e estar dentro da lei. Além da documentação, porém, ainda é preciso contar com a interpretação do policial
Qualquer rodão aro 18? Tem como legalizar tudo isso? Se essas dúvidas atormentam sua mente, seja bem-vindo ao grupo. Você não é o único a desconhecer essas regras da modificação mecânica. Até policiais rodoviários que fazem blitze na estrada podem ficar na dúvida na hora de dizer o que pode usar ou não.
Quando se fala de alterações no motor que afetem a potência ou o tipo de combustível, elas devem ter sempre o aval do Detran local. O mesmo vale para a mudança de categoria do veículo - caso alguém planeje converter um automóvel fechado em conversível, por exemplo. Mas o caminho não é tão simples assim. Há um roteiro burocrático a seguir, que envolve até vistoria técnica feita por oficina credenciada (leia texto na pág. 106), para receber um novo documento, no qual constará que o veículo é modificado. A lei não estipula nenhum limite de potência para a preparação do motor. Se a oficina credenciada aprovar - o que na prática sempre acontece -, não há problema algum.
Multa e sermão
Esses são cuidados essenciais para estar dentro da lei e evitar dores de cabeça ao rodar por aí com o veículo modificado. Assim você não corre o risco de passar por uma saia-justa como a do empresário paulista João Carlos Guimarães, 45 anos, que mandou instalar um turbo num Golf 1.6. "Nem me preocupei com a documentação. Mas numa viagem fui parado. O que chamou a atenção dos guardas foi o barulho da válvula de prioridade (peça responsável por aquele 'espirro' tão característico de algumas turbinas)." Não teve jeito: João Carlos acabou sendo multado. "Ainda tive de ouvir um sermão do policial, sobre a minha idade e o motivo de ficar andando de turbinado por aí", afirma. Nesse caso, você pode ganhar uma multa de 127,54 reais, receber 5 pontos no prontuário e ter o carro aprendido.
No entanto, mesmo tomando os cuidados legais, ainda assim houve motorista multado. Os irmãos Paulo e Pedro Cardoso de Farias, de Curitiba (PR), regularizaram sua Saveiro 2005 turbinada, mas o documento expedido pelo Detran paranaense não trouxe - como manda a lei - a inscrição "veículo modificado". Havia apenas a alteração no campo "potência". Quando viajaram a São Paulo, foram autuados. "Mostramos até mesmo a cópia autenticada da autorização do Detran do Paraná, mas não teve jeito", diz Pedro. Consultado, o Detran paranaense reconhece que houve esse tipo de erro, porém afirma que, há cerca de um ano, todos os novos documentos expedidos passaram a ter a inscrição "veículo modificado".
Membro da Câmara Temática do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) por duas vezes e advogado especializado em legislação de trânsito, o paranaense Marcelo José Araújo também é um amante do tuning e conta que já sofreu em blitze, mesmo com o carro em ordem. Até aprendeu um truque simples e eficiente. "Quando eu tinha meu Golf GTi tunado, para evitar problemas com a polícia, andava sempre com uma foto da versão de exportação do carro no porta-luvas, na qual ele foi inspirado. Assim o guarda podia ver que existia uma versão original de fábrica com aquelas características", afirma Marcelo. "Mas em tese não há problemas em andar com um veículo equipado com saias e pára-choques esportivos, pois esses equipamentos são liberados pelo Código de Trânsito."
O preparador paranaense Anderson Luiz Gaideski já passou por apuros mesmo num carro original de fábrica. Ele levava o Subaru WRX de um cliente para a oficina quando foi parado. "O policial viu a turbina no motor e disse que não era de fábrica. Como no documento não havia a palavra 'Turbo', ele me multou", diz Anderson. Até hoje, um ano depois, ele tenta reaver na Justiça os cerca de 1200 reais que gastou com a multa, o reboque e a permanência no pátio do Detran.
É justamente para contornar esse tipo de situação que Marcelo José Araújo evita alterações radicais em seu carro, atualmente um Mercedes C 280 que recebeu apenas vistosas rodas de 17 polegadas. O advogado especializado no assunto explica que as alterações nas rodas são permitidas, desde que o diâmetro do pneu mais o aro seja igual ao conjunto original e que a largura total não ultrapasse o pára-lama. Por via das dúvidas, porém, ele prefere andar com uma foto de divulgação de um modelo de fábrica só para fugir dos problemas.
Outra dúvida comum no mundo do tuning é a suspensão. Para automóveis em geral, rebaixar é proibido. Mas aí há um problema de interpretação. A resolução 25/98 do Contran proíbe alterações nos veículos mistos e de passeio, mas omite os de carga. Portanto, na teoria, rebaixar uma picape - ou mesmo um caminhão - não é ilegal.
Rodolfo Moreira considera a proibição injusta. Para ele, o ideal seria adequar a nova potência a um sistema de frenagem reforçado - sim, também é probido mexer em freio - ou a uma suspensão retrabalhada, mais segura. "A lei é antiga, não faz sentido hoje. Antigamente o pessoal apenas cortava a mola. O resultado era uma porcaria. Hoje há kits testados pela montadora que às vezes são bem melhores que o original", afirma.
Mesmo sabendo do risco, o preparador conta que já desfilou por rodovias com um Corsa GSi rebaixado e parou em várias blitze. E até aprendeu algumas regras: "Em geral, param o carro quando está muito rebaixado ou quando se está num tradicional local de rachas. Ah, e se for um carrão importado, como BMW ou Mercedes mexido, dificilmente vão parar." Hoje ele concorda que o melhor é não arriscar e andar sempre na lei.
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Como regularizar um motor mexido
Para rodar com o motor preparado, o primeiro passo é ir ao Detran e pedir autorização para a mudança. Dependendo do estado, pode ser necessário pagar uma taxa. Leve o documento de transferência (CRV) e o certificado de registro e licenciamento (aquele que deve acompanhar o carro no dia-a-dia), além de RG, CPF e comprovante de residência do dono do veículo. Na maioria das vezes, um despachante pode cuidar do processo, que pode levar um mês. "Custa o mesmo que uma transferência", diz José Carlos Júnior, do Despachante Porsche, de São Paulo. Depois disso, o motor pode ser modificado. Não se esqueça de pedir as notas fiscais. O próximo passo é fazer uma vistoria em oficina certificada pelo Inmetro. A lista está no site do órgão
( www.inmetro.gov.br/qualidade/etp.asp ). Ao final, a oficina emite o Certificado de Segurança Veicular (CSV). Finalmente, com o CSV e a documentação em mãos, o veículo passa por uma vistoria de chassi no Detran, que vai emitir um novo certificado de registro, no qual deve constar a frase "veículo modificado".
Guia rápido do tuning legal
MOTOR
Qualquer modificação é permitida, desde que autorizada pelo Detran, após passar por vistoria em oficina credenciada. Turbina, garrafa de nitro e filtro de ar esportivo à mostra são suficientes para que o agente da lei multe e apreenda veículo.
CHIP DE POTÊNCIA
Na teoria, a reprogramação da injeção também precisa passar pela tal vistoria técnica. Na prática, ninguém se preocupa com isso, nem mesmo o policial, pois não há como saber se o chip foi trocado ou reprogramado.
RODAS E PNEUS
Rebaixar, nem pensar. Pela legislação, não se podem alterar num automóvel os amortecedores, as molas e outras peças do sistema. Mas, se for uma picape, a lei não proíbe.
FREIOS
Nenhuma modificação é permitida, mesmo que seja um conjunto Brembo de primeiríssima linha.
KIT AERODINÂMICO
A legislação não impede o uso de spoiler, saias ou aerofólios, mas também não diz que pode. Segundos interpretação de advogados especializados, o uso é livre.
FARÓIS DE XENÔNIO
Aqui é polêmico. Em tese não pode mexer nos faróis. Mas especialistas argumentam que, se alguma versão de Golf, por exemplo, sai de fábrica com xenônio, então se poderia instalar o kit em qualquer outro Golf. Os faróis auxiliares estão liberados.